O início de 2025 trouxe notícias felizes para muitas famílias. As prestações do crédito à habitação estão finalmente a baixar. A quebra nas taxas Euribor e as revisões nos contratos de crédito significam, para alguns, uma poupança mensal significativa. Por exemplo, de acordo com o simulador do ECO, quem tem um empréstimo de 150 mil euros, a 30 anos, indexado à Euribor a 12 meses e com um spread de 1% paga agora menos 107,92 euros por mês em relação ao ano passado. Ainda assim, este alívio pode não ser suficiente para apagar as consequências de uma política monetária que muitos consideram ter ido longe demais.

A taxa de inflação na Zona Euro voltou a subir em dezembro, afastando-se novamente da meta de 2% estabelecida pelo Banco Central Europeu. E, embora o BCE já tenha iniciado cortes nas taxas de juro – com quatro descidas de 0,25 pontos percentuais desde junho –, o dilema persiste em Christine Lagarde: será possível corrigir os erros passados, acelerando a recuperação económica, sem comprometer o controlo da inflação?

As decisões tomadas no passado recente levantaram dúvidas. O BCE implementou dez aumentos consecutivos nas taxas de juro num curto espaço de tempo, numa tentativa de conter uma inflação elevada, impulsionada por choques externos, como a crise energética. Mas o impacto na economia foi severo. Governadores, como Mário Centeno, alertaram para os riscos de deterioração económica, sublinhando que a inflação poderia mesmo cair abaixo dos 2% em 2024, o que deveria justificar uma política monetária mais expansionista.

Um estudo do Financial Times publicado nos primeiros dias de 2024 revelou que 42% dos economistas inquiridos acreditavam que o BCE tinha apertado demasiado a sua política monetária. Stefan Gerlach, ex-vice-presidente do banco central da Irlanda, destacou o risco de se ter sobreavaliado a força da economia da zona euro. De facto, o crescimento económico europeu é anémico em comparação com os EUA ou a China. Em 2025, o BCE prevê que a zona euro cresça apenas 1,1%, enquanto o FMI prevê para os EUA um crescimento de 2,2% e para a China de 4,6%.

O preço a pagar pelas subidas consecutivas e repentinas das taxas de juro foi um arrefecimento económico que parece ter sido excessivo. Agora, os cortes sucessivos nas taxas de juro surgem como uma tentativa de mitigar os danos causados. Mas estará o BCE a agir tarde demais? Provavelmente, sim.

Há ainda um outro problema estrutural que não pode ser ignorado. A meta de inflação de 2% está cada vez mais a ser questionada. Christine Lagarde, presidente do BCE, insistiu repetidamente que esta meta era crucial para garantir a estabilidade económica. No entanto, a realidade global aponta para um novo paradigma. O aumento das tensões geopolíticas, a desglobalização e a fragmentação dos blocos económicos estão a criar uma inflação mais volátil e menos previsível.

Manter a inflação a 2% poderá exigir práticas monetárias excessivamente restritivas, com impactos negativos permanentes na economia. Uma inflação moderada, entre 2,5% e 3%, poderia ser uma alternativa mais realista e sustentável para o contexto atual.

Com o novo ano, o BCE enfrenta uma equação sem solução fácil. Por um lado, precisa de continuar a reduzir as taxas de juro para estimular a economia. Por outro, o risco de descredibilizar a instituição, ao não controlar eficazmente a inflação, paira no horizonte.

Num mundo em constante mudança, insistir numa meta rígida de inflação pode ser um erro estratégico. Tal como a história recente demonstrou, uma política monetária demasiado agressiva pode causar danos profundos e difíceis de corrigir. Para quem tem crédito à habitação, o alívio é bem-vindo. Mas, para a economia europeia, é urgente que o BCE olhe para além das métricas convencionais e ajuste as suas estratégias ao “novo normal”.