Aproximava-se 2015 e avaliava-se a Agenda do Milénio, que consagrou os Objetivos de Desenvolvimento do Milénio (ODM), preparando a transição para a Agenda 2030 e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). Os ODM falharam na erradicação da pobreza, apesar de alguns países relatarem 100% de cumprimento de metas, muitas vezes com base em critérios meramente quantitativos, como a taxa de matrícula escolar sem garantir qualidade na educação.

Essa limitação foi corrigida nos ODS, que incorporaram indicadores qualitativos, não tendo, no entanto, eliminado discrepâncias na monitorização da pobreza.

A definição do Banco Mundial para pobreza extrema—originalmente US$1,25/dia, atualizado para US$2,15/dia em 2022—demonstra a artificialidade do conceito. Uma pessoa que ganhe US$2,16/dia deixa de estar em situação de pobreza extrema, evidenciando a fragilidade dessas métricas.

O ODS 1 propõe erradicar a pobreza extrema até 2030, embora, em outubro de 2024, o Banco Mundial já tenha declarado que essa meta está fora de alcance e exigiria pelo menos mais três décadas...

Portugal, segundo o Europe Sustainable Development Report 2025, surge com cerca de 70 pontos em 100, ocupando o 22.º lugar entre 34 países europeus. Curiosamente, o ODS 1 é o único classificado como "atingido", enquanto os outros 16 estão "estagnados" ou apresentam "progressos moderados". No entanto, ao consultamos os dados da Pordata, da Fundação Francisco Manuel dos Santos, 2,1 milhões de pessoas encontram-se em risco de pobreza em Portugal, o que evidencia a complexidade do tema e o risco de perceção de “objetivo atingido”.

Em Portugal, setor fundacional e filantrópico pode desempenhar um papel importante na mitigação da pobreza não apenas no apoio direto, mas também através de programas  desenvolvidos por fundações como a Fundação La Caixa, Calouste Gulbenkian, Fundação EDP,  Fundação Santander, Fundação Montepio, Fundação Oriente, Fundação Millennium BCP, Fundação MEO, Fundação Belmiro de Azevedo, Fundação GALP e muitas outras que visam apoiar as populações vulneráveis, financiamento de projetos de intervenção e inovação social e o fortalecimento do setor social.

Mas o setor fundacional e filantrópico vai além do financiamento de programas e projetos, a filantropia impulsiona redes de cooperação, conhecimento, participação cívica e modelos sustentáveis de desenvolvimento, contribuindo para a formulação de políticas públicas mais eficazes.

Iniciativas como o compromisso assumido por mais de 50 fundações signatárias da Convenção para a Implementação dos ODS promovido pelo Centro Português de Fundações, reforçam o papel do setor fundacional no desenvolvimento sustentável.

Porém, o compromisso nacional com os ODS não se limita às fronteiras internas. A indivisibilidade dos ODS significa que seu cumprimento depende de esforços coletivos globais. O ODS 17 sublinha a importância das parcerias internacionais para a implementação dos objetivos. Um exemplo é a Ajuda Pública ao Desenvolvimento (APD) portuguesa, que, segundo o relatório Aid Watch 2024, caiu para 0,19% do Rendimento Nacional Bruto em 2023, abaixo da meta internacional de 0,7%.

Estatísticas ou realidade? A avaliação dos progressos deve ser feita com rigor e verdade, evitando cosméticas estatísticas que possam obscurecer a complexidade da pobreza e os desafios reais da sua erradicação.

Pedro Krupenski, Fundação Oriente, e Ricardo Garcia, Centro Português de Fundações