O governo apresentou recentemente o seu Plano de Ação para a Comunicação Social, composto por 30 medidas com as quais pretende contribuir para a resolução da crise em que o setor se enfrenta, alegando que as suas propostas irão “assegurar a sustentabilidade, o pluralismo e a independência” dos media.

Porém, sabemos bem que entre as intenções e as consequências vai muitas vezes um enorme fosso. E, na verdade, este Plano de Ação não parece passar de um penso rápido, que se limita a atirar os problemas de fundo para mais tarde, além de contribuir para minar a sustentabilidade e a independência que diz querer fomentar.

Seria possível dissecar cada uma das propostas individualmente para verificarmos como uma vasta maioria destas têm mais impactos negativos que positivos, mas, para não aborrecer demasiado o leitor, apontemos o foco para três exemplos que considero paradigmáticos das falhas deste plano.

O primeiro que abordaremos prende-se com a RTP, à qual o governo quer impor a existência de uma plataforma de verificação de factos. Num documento que tanto prega a independência da comunicação social, este é um flagrante exemplo de como a prática não vai ao encontro da retórica, representando uma clara ingerência na autonomia editorial da RTP. Não cabe aos decisores políticos decidir que programas a RTP deve ou não produzir e é a esta que cabe decidir qual o modo mais eficaz de contribuir para o combate à desinformação.

Outra nova decisão prende-se com a publicação de deliberações autárquicas nos jornais regionais ou locais. Finalmente regulamentando uma obrigação legal que nunca havia sido posta em prática, o governo estabelecerá um procedimento para que certas decisões do poder local tenham que ser publicitadas nos órgãos locais, incluindo jornais digitais e sítios da internet das rádios.

Para além de estar a fomentar a dependência da comunicação social regional e local do poder político autárquico, incentiva também modelos de governança errados. Se a publicação em jornais impressos ainda pode ser defendida como forma de chegar aos menos versados nas novas tecnologias, não há justificação para despender dinheiro público em publicações em websites de rádios, quando a autarquia o pode mais facilmente fazer na sua própria morada online.

É ainda caricato que o governo apresente o custo estimado desta medida em zero euros. Realmente, não é dos cofres do Estado central que sairá o dinheiro para cobrir estas despesas, mas sim dos das autarquias. Porém, no final de contas, quem paga é o mesmo, o contribuinte.

Por último, temos também o anúncio da criação de descontos para recurso aos serviços da Lusa, da qual o governo anunciou ainda pretender adquirir o remanescente do capital ainda privado. Anunciando descontos de 30% a 50% para órgãos nacionais e de 50% a 75% para órgãos locais no recurso aos serviços da Lusa, o governo lamenta-se até de, fruto das normas europeias, não poder oferecê-los gratuitamente.

Uma agência noticiosa de propriedade privada ou, pelo menos, com decisões de gestão autónomas providencia um maior garante da independência do poder político, mas o governo decidiu agir em sentido contrário e, com ajuda deste golpe nos cofres da agência estimado em 2 milhões de euros, garante que esta continua subordinada à sua ação.

Esta foi apenas uma amostra de como este se trata de um plano de vista curta, que pretende fabricar receita para esconder e deixar por tratar as questões estruturais que afetam um setor a lidar com uma crise de identidade e que tem sido incapaz de se adaptar ao mundo contemporâneo. Há certamente boa vontade nas propostas apresentadas, mas ainda que estas medidas consigam disfarçar esses problemas por um curto período, eles rapidamente voltarão a impor-se e obrigar-nos-ão a caminhar na direção de uma reflexão muito mais profunda e assertiva que aquela que o governo tomou.

Licenciado em Direito e Psicologia e membro da Iniciativa Liberal