
Alice dos Reis, Evy Jokhova, Francisco Trêpa, Inês Brites, Maja Escher e Sara Chang Yan são os seis artistas finalistas, escolhidos entre cerca de 600 candidaturas por um júri de três curadores, também responsáveis pela curadoria da exposição dedicada à 15.ª edição deste prémio no valor de 20 mil euros, indicou hoje a organização durante uma visita para jornalistas.
A relação dos humanos com a natureza, as questões existenciais e a busca pela espiritualidade são das mais representadas nos projetos inéditos dos seis artistas escolhidos por um júri constituído pelos curadores Catarina Rosendo, professora universitária, Luís Silva, diretor da Kunstalle Lissabon, e Sérgio Mah, diretor-adjunto do MAAT e professor universitário.
"A escolha tem sempre uma subjetividade presente, mas o critério fundamental foi a qualidade artística", sublinhou Sérgio Mah no início da visita pré-inaugural, apontando ainda que os curadores tiveram a preocupação de "criar condições para os artistas exporem as suas obras sem conflitos estilísticos umas com as outras".
Na instalação de Maja Escher (Santiago do Cacém, 1990), objetos em tecido, cerâmicas e sementes surgem suspensas do teto ou colocadas no chão, inspiradas nas festas populares, para serem experimentadas pelos visitantes e aproximá-los da natureza como entidade familiar, "questionando o paradigma dualista atual em que é encarada como algo exterior".
"Acredito na dependência entre todos os seres vivos e interessa-me pensar a ecologia dos lugares e nas relações entre as pessoas desses lugares", declarou a artista durante a visita para jornalistas, acrescentando que a perspetiva do seu trabalho vai no sentido contrário da independência e individualismo.
Filha de pais alemães, Maja Escher cresceu na serra de Odemira e o ambiente natural dessa região, as tradições e sabedoria locais foram influenciando a sua obra, na qual usa a terra para tingir tecidos, sementes ou pedras que descobre ou lhe são oferecidas.
Na obra "O Conto Marítimo do Caranguejo-eremita", a artista Evy Jokhova (Genebra, 1984) usa a história de vida desta espécie como metáfora para refletir sobre o contexto da crise habitacional em Lisboa, onde vive há seis anos, e o seu impacto na esfera social e na paisagem urbana.
"O caranguejo-eremita é o único que nasce sem carapaça e passa a vida à procura de uma que lhe sirva", explicou a artista multidisciplinar cuja prática investiga as relações da natureza com as estruturas sociais e a arquitetura do ponto de vista antropológico, filosófico e artístico.
Dependendo de conchas e outros moluscos para se proteger e sobreviver, o caranguejo é usado na instalação -- uma grande tenda circular feita em tecido onde está representado pelas pinças -- como uma referência da adaptação de Evy Jokhova à nova cidade onde passou a viver, e também sobre o aumento de sem-abrigo em Lisboa e noutras cidades do mundo.
Na instalação de Francisco Trêpa (Lisboa, 1995) a natureza também está em foco através das cegonhas e das dificuldades de adaptação ao mundo artificial: "Muitas morrem eletrocutadas nas redes elétricas, o que acaba por ser irónico porque também danifica essas linhas", apontou o artista que tem vindo a desenvolver uma prática em torno das relações ambíguas entre plantas, tecnologia e outros seres, provenientes do mundo natural ou artificial, que retransforma nas suas esculturas.
Intitulada "Cicconia Cicconia", a instalação reúne elementos em cerâmica, madeira, parafina e lã, integrando uma estrutura onde se encontram ninhos de cegonha e esculturas, num cenário que Trêpa descreve como "sci-fi barroco", cruzando ficção, futurismo, humor, e também indicações de renovação e esperança.
Inês Brites (Coimbra, 1992), artista que vive e trabalha em Lisboa, criou uma instalação igualmente inspirada nas relações entre as pessoas e a natureza, dando nova vida a objetos do quotidiano feitos em resina ou silicone, e animados a partir do seu interior, com água ou luz.
"Quis equiparar a presença humana com a de objetos úteis mas habitualmente desvalorizados, que refletem afetos e a vulnerabilidade da sociedade atual, mergulhada no consumismo", explicou a artista.
Por seu turno, Sara Chang Yan (Lisboa, 1982) criou "Sentir o coração pleno e seguro", uma obra com vários elementos afixados na parede, misturando símbolos e cores, resultado de um processo de depuração e exploração da relação entre o desenho, o espaço e a perceção sensorial.
"Comecei a desenhar e a retirar tudo o que tinha a ver com a realidade do mundo, as guerras, a política, à procura do abstrato e das sensações que os objetos me provocam. Dessa forma comecei a perceber a estrutura do meu interior", relatou aos jornalistas a artista que atualmente vive e trabalha entre Lisboa e os Açores.
Neste processo, Sara Chang Yan -- cuja obra expande os limites do desenho e investiga a forma como o traço pode existir além do papel, interagindo com a luz e o espaço -- disse sentir um fascínio com a ideia de um Deus inclusivo e as vivências espirituais como a oração e a intuição, que têm influenciado o seu trabalho.
Por seu turno, Alice dos Reis (Lisboa, 1995), artista visual e realizadora, apresenta uma videoinstalação intitulada "Oh Be a Fine Girl Kiss Me", e "Freiras caminham de madrugada, meio--dia, crepúsculo e noite", uma tapeçaria narrativa onde um grupo de freiras, algumas das quais grávidas, acompanhadas por gatos, caminham em direção a um misterioso objeto voador não identificado que emana luz do interior.
A artista explicou que o seu trabalho tem sido inspirado pelas questões de género e genealogia pessoal, e nesta obra em especial evoca o trabalho realizado, entre 1917 e 1921, por quatro freiras da comunidade Suore di Maria Bambina.
Estas freiras mapearam quase meio milhão de estrelas para o Observatório do Vaticano: "Elas foram escolhidas pela sua paciência e grande capacidade de precisão. Chamaram-lhes ´máquinas de calcular´", explicou a artista.
A exposição dos seis finalistas da 15.ª edição Prémio Novos Artistas Fundação EDP ficará patente ao público entre quinta-feira e 8 de setembro no MAAT Central, e no seu decorrer um júri internacional irá nomear o artista vencedor.
O Prémio Novos Artistas Fundação EDP, um dos mais relevantes em Portugal, foi criado em 2000 -- passou a ser bienal em 2005 -- com o objetivo de apoiar e dar visibilidade à produção de artistas emergentes nas artes plásticas e visuais.
Nas edições anteriores, foram distinguidos Joana Vasconcelos (2000), Leonor Antunes (2001), Vasco Araújo (2002), Carlos Bunga (2003), João Maria Gusmão e Pedro Paiva (2004), João Leonardo (2005), André Romão (2007), Gabriel Abrantes (2009), Priscila Fernandes (2011), Ana Santos (2013), Mariana Silva (2015), Claire de Santa Colomba (2017), Diana Policarpo (2019) e Adriana Proganó (2022).
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