1 - Democracia viva no tradicional desfile popular da avenida da Liberdade, em Lisboa. Em liberdade, de facto, em paz e serenidade, com a saudável convivência de cidadãos de todas as idades e crenças políticas.

A polémica decisão do governo de adiar celebrações do 25 de Abril devido ao luto nacional pela morte do Papa Francisco terá motivado mais pessoas a festejar a liberdade, num protesto tranquilo em pleno período eleitoral pela aparente desvalorização dos 51 anos da revolução dos cravos. Portanto, normalidade democrática, com o povo a sair à rua em Lisboa e Porto.

2 - O 25 de Abril de 2025 fica, no entanto, marcado por confrontos entre movimentos de extrema-direita e manifestantes antifascistas, num encontro que não estava autorizado e terminou com a intervenção da PSP e a detenção de chefias dos grupos extremistas.

Pode parecer um paradoxo que, no dia da Liberdade, as autoridades tenham dispersado pela força os manifestantes autores dos desacatos, mas a democracia pressupõe ordem e a intransigente defesa dos direitos cívicos perante grupos subversivos ditos nacionalistas.

Ironicamente, estes tumultos tiveram lugar junto ao palácio da Independência, perto do Rossio, onde aconteceu a restauração de Portugal, em 1640. Nessa época, os movimentos revoltosos e populares tinham uma causa nobre, o que não é, de todo, o caso destes grupos extremistas que semeiam caos e desunião em 2025.

3 - Há 50 anos, o povo português foi votar em liberdade, pela primeira vez, após uma longa ditadura. As reportagens, televisivas e fotográficas, desse acontecimento nacional mostram rostos de genuína felicidade pela possibilidade de homens e mulheres exercerem o voto, com uma participação da ordem dos 90%.

Perante imagens de um país rural e pobre, que sobrevivia a 50 anos de ditadura fascista, os testemunhos populares dessas primeiras eleições livres, em 1975, são quase comoventes, mas também preocupantes perante a elevada abstenção registada nos últimos largos anos.

Nota ainda para a oportuna recordação, no Telejornal, da primeira emissão eleitoral da RTP (36h) de cobertura das primeiras eleições livres.

4 - 25 de Abril é ainda marcado pela cerimónia evocativa no Parlamento, com destaque para os discursos do Presidente da República e do Presidente da Assembleia da República, além dos representantes dos partidos políticos. Em luto nacional, Francisco foi evocado por Marcelo, no seu último discurso do 25 de Abril num mandato que termina em março do próximo ano.

Ao final do dia da Liberdade, voaram para o Vaticano quatro dos mas altos representantes do Estado (laico) português: Presidente da República, Presidente da Assembleia da República, primeiro-ministro e também o ministro dos Negócios Estrangeiros.

Mandaria a prudência e o bom-senso que os líderes do País não viajassem juntos até ao Vaticano para participarem no velório e funeral do Papa Francisco, por mais relevante e justa que seja a homenagem ao mais carismático e popular líder mundial do século XXI.

Bastaria que, em representação de Portugal, viajasse o Chefe de Estado e o representante da diplomacia. Qual será o critério para futuras situações? A democracia que agora celebramos pressupõe que o poder simbólico das instituições seja gerido e preservado de forma sábia e serena, mas, pelos vistos, os dirigentes também apreciam gozar de total liberdade neste caso, em nome do Papa.

Jornalista