
Amadeo Pietro Giannini, que também viria a ser conhecido por A.P. Giannini, nasceu em San Jose, Califórnia, a 6 de maio de 1870. O pai, Luigi Giovanni, chegara na década de 1860 à Califórnia e passara vários anos à procura de ouro. Um dos amigos desta aventura correspondia-se com a irmã Virgínia, que estava em Itália. Em 1869, Luigi regressou a Itália, à pequena aldeia italiana de Acereto, para conhecer Virgínia, com quem se casou a 10 de agosto de 1869, seis semanas depois de se conhecerem pessoalmente.
O casal viajou de navio para Nova Iorque e, através do caminho de ferro transcontinental recentemente concluído, de Nova Iorque para Omaha no Utah, chegou a San Jose em finais de setembro de 1869. Dada a sua data de nascimento, A.P. também fez esta viagem na forma “mais confortável de todas; ele foi abrigado no útero de sua corajosa mãe”, como escreveu o seu biógrafo Gerald D. Nash.
Nasceu no Swiss Hotel em San Jose, que os seus pais tinham alugado e exploravam, servindo, sobretudo, imigrantes italianos solteiros. Dois anos depois, compraram quarenta acres em Alviso, uma aldeia agrícola a oito milhas a norte de San Jose, onde cultivavam frutas e legumes que vendiam a empresas de São Francisco. Em meados de agosto de 1876 ou de 1877, Luigi Giannini teve uma discussão com um dos seus trabalhadores por causa de uma dívida de um ou dois dólares. Pouco depois, o trabalhador disparou sobre Luigi, episódio a que Amadeo Pietro assistiu.
A viúva com dois filhos, além de Amadeo, Attilio, nascido em 1874, e grávida de um terceiro filho, continuou a trabalhar na quinta e a vender produtos agrícolas para São Francisco. Conheceu um condutor que conduzia carroças e transportava produtos para os agricultores locais. Chamava-se Lorenzo Scatena, casaram-se em 1880. Dois anos depois, a família mudou-se primeiro para San Jose e, no final de 1882, para São Francisco, e Lorenzo foi trabalhar para uma casa de venda de frutas e legumes. No final de 1883, nasceu a L. Scatena & Company, que comprava e vendia produtos agrícolas.
Comerciante de frutas
Aos 12 anos, A.P. Giannini parecia mais interessado no negócio da família do que nos estudos e gostava de passar tempo com o contabilista da empresa, um idoso irlandês chamado Tim Delay, onde aprendeu os mistérios dos livros de contas. A certa altura, o seu padrasto foi surpreendido por ofertas pelas suas colheitas, vindas de agricultores da região, com quem nunca se relacionara. Descobriu que fora A.P. Giannini que escrevera uma dúzia de cartas para potenciais novos clientes em São Francisco, prometendo “preços honestos e excelente serviço”. Foi o primeiro empreendimento comercial de sucesso de A.P. Giannini.
No final da primavera de 1885, deixou a escola para se dedicar a tempo inteiro à L. Scatena e Co., mas para convencer a mãe, que estava contrariada com a decisão, em seis semanas fez um curso de contabilidade, na Heald Business School em São Francisco. Em 1891, ficou com 50% da empresa depois de se ter tornado responsável pelas operações de campo da empresa, onde passou de intermediário a corretor e intermediário financeiro também.
Como escreveu Felice Bonadio em “A. P. Giannini: Banker of America”, A.P. Giannini criou “rapidamente uma reputação de integridade pessoal e práticas comerciais honestas. Em vez de manter os agricultores no escuro sobre os preços, fornecia uma lista de preços dos produtos em São Francisco. No mudar do século, a L. Scatena era a maior empresa grossista de produtos agrícolas de São Francisco”.
Aos 22 anos, casou com Florinda Agnes Cuneo, filha de imigrantes italianos da região de Génova. O pai, Giuseppe ou Joseph Cuneo, era um abastado empresário de São Francisco, com vários interesses imobiliários e financeiros. A.P. Giannini envolveu-se na política de São Francisco em 1899 e, em 1901, subitamente, vendeu as suas ações da L. Scatena & Cº (avaliadas entre 100 mil e 200 mil dólares) a vários colegas de trabalho e retirou-se do negócio de produtos agrícolas, dedicando-se aos investimentos imobiliários.
Em 1902, o sogro de Giannini, Joseph Cuneo, morreu, deixando viúva e onze filhos, que, em vez de fazerem as partilhas, colocaram a gestão de mais de uma centena de propriedades nas mãos do cunhado, A.P. Giannini. O acordo era para dez anos e A.P. Giannini ficou com 25% de qualquer aumento do valor dos imóveis.
Substituiu o sogro na administração de um pequeno banco de North Beach, Columbus Savings & Loan, que tinha sido fundado por John Fugazi em 1893, para servir a comunidade ítalo-americana. A.P. Giannini assumiu a posição de Joseph Cuneo no conselho de administração e, logo na primeira reunião, ficou impressionado pelo facto de o banco não estar a competir ativamente com um banco mais recente através da procura agressiva de clientes, da abertura de contas correntes e a fazer empréstimos a trabalhadores comuns.
A.P. Giannini viajara pela Califórnia e sabia que os agricultores, comerciantes e trabalhadores precisavam de dinheiro, não apenas em North Beach. A Scatena & Co chegou, ocasionalmente, a atuar como banqueiro para muitos dos seus clientes, comprando antecipadamente as colheitas dos agricultores, fazendo empréstimos sem juros. Sabia, por experiência, que se podia confiar neles para pagarem as suas dívidas.
As ideias de A.P. Giannini foram rejeitadas pelos outros administradores e Fugazi acusou-o de ser “um jovem e ambicioso… apaixonado por grandes planos e ideias loucas”, segundo Bonadio. Isaias W. Hellman, que também era presidente do Nevada National Bank, não via razão para mudar de política. Acostumado a vencer a maioria das batalhas, A.P. Giannini pressionou a gestão mas, numa votação sobre a sua estratégia, perdeu. Pouco depois, descobriu que um dos gestores aceitava comissões para a concessão de empréstimos e vendia seguros de incêndio aos clientes do banco e ficava com os prémios, mas o conselho de administração não tomou qualquer atitude.
A criação da nova banca
“Talvez nunca tivesse entrado no mundo da banca se não tivesse ficado tão zangado com os diretores do Columbus”, sublinhou A. P. Giannini. O seu primeiro passo no verão de 1904 foi falar com James Fagan, vice-presidente do American National Bank, com o qual a L. Scatena tinha relações comerciais e disse-lhe: “Giacomo, vou abrir um banco. Diga-me como fazê-lo”. A sua primeira luta foi encontrar acionistas para o banco. Angariou 300 milhões de dólares de empresários locais, vendendo ações a 100 dólares por ação. Quando o banco abriu com 160 acionistas, grande parte eram empresários de North Beach, que conhecia bem.
Em 15 de outubro de 1904, surgiu o Bank of Italy, que se instalou num pavilhão reconvertido em escritórios do outro lado da rua do Columbus Savings & Loan, dirigido a trabalhadores e pequenos empresários. A.P. Giannini tinha 34 anos, era o vice-presidente, não tinha salário na nova instituição financeira e começou a fazer banca à sua maneira. Batia às portas para encontrar clientes, levantando-se cedo para angariar negócios nas docas e nos mercados. Fazia empréstimos de apenas 25 dólares a trabalhadores que não tinham garantias, avaliando-os não pelo dinheiro, mas pelo seu caráter e pelas suas mãos de trabalho. Colocava anúncios nos jornais e distribuía panfletos. Os outros banqueiros queixavam-se de que a publicidade de A.P. Giannini era indigna, ao que ele respondia: “Como é que as pessoas podem saber o que um banco pode e vai fazer por elas se não lhes for dito?”. Ao fim de um ano, os depósitos ultrapassaram os 700 mil dólares (31,7 milhões de dólares em 2025).
Em 18 de abril de 1906, um terramoto e uma sequência de incêndios devastaram São Francisco. Antes que o edifício do seu banco fosse devorado pelas chamas, Amadeo Giannini, que morava em Seven Oaks, San Mateo, mal sentiu as reverberações do tremor de terra pelas 5 da manhã, deslocou-se para São Francisco e encheu dois vagões de produtos agrícolas da Scatena & Cº com o numerário, o ouro e os registos bancários do cofre do banco que cobriu com caixas de laranjas para os esconder. De seguida, levou-os para a sua casa em San Mateo, a cerca de 20 milhas de distância.
Esta decisão revelou-se uma vantagem comercial porque, enquanto as outras instituições financeiras lambiam as feridas provocadas pelos incêndios que sobreaqueceram os cofres, Amadeo Giannini, que tinha uma memória quase fotográfica para nomes e rostos, improvisou uma agência bancária no cais de Washington Street e emprestou dinheiro para a reconstrução de São Francisco. Os empréstimos eram concedidos apenas com um aperto de mão e foram reembolsados.
Já quando se gerou “o pânico de 1907”, uma crise financeira nos Estados Unidos; na Califórnia, o Banco de Itália conseguiu continuar a emitir moeda e a pagar ouro à vista, sobrevivendo enquanto muitos outros bancos foram à falência.
Um banco nacional
O sucesso do banco após o terramoto encorajou-o a expandir-se para outras cidades da Califórnia. Amadeo Giannini financiou inúmeras indústrias, desde projetos cinematográficos empreendidos em Hollywood, como a United Artists de Mary Pickford e Charlie Chaplin em 1923, ou fazer um empréstimo de 2 milhões de dólares a Walt Disney para financiar a produção de Branca de Neve, até à indústria vinícola da Califórnia e grandes obras de construção, como a Ponte Golden Gate, em 1932, que havia 14 anos que estava planeada e onde o Bank Of America comprou seis milhões de dólares em títulos. Entre os seus empreendimentos contava-se também a start-up HP (Hewlett-Packard), que na altura fabricava osciloscópios.
Em 1909, Giannini começou a comprar bancos na Califórnia, rompendo com a tradição americana de bancos locais independentes, fornecendo os mesmos serviços bancários às comunidades jugoslava, russa, mexicana, portuguesa, chinesa, grega e outras. Em 1918, o Bank of Italy tinha-se tornado o primeiro sistema bancário, uma rede de agências bancárias nos Estados Unidos, com a compra de bancos em Nova Iorque. Em meados da década de 1920, detinha o terceiro maior banco do país. Além disso, diversificou a sua atividade para os seguros, o investimento bancário e a banca hipotecária.
A.P. Giannini desprezava a maioria dos banqueiros, não confiava nas grandes empresas, nem em Wall Street. Estava a construir uma rede de agências bancárias a nível nacional que ofereceria empréstimos, investimentos e seguros. Adquiriu bancos em todo o oeste dos Estados Unidos, preparando-se para uma expansão por todo o país. O Banco of Italy cresceu e Giannini adquiriu outros bancos, incluindo o Bank of America da Califórnia (e um Bank of America em Nova Iorque). Esta construção do primeiro sistema bancário estatal na América foi boicotada por vários banqueiros que recorreram à Reserva Federal, que colocou vários obstáculos em 1928 à consolidação destas operações bancárias.
Nessa altura, no âmbito deste boicote, alguns bancos colocaram ações do Bank of Italy e do BancItaly em Wall Street para fazer baixar o valor dos bancos californianos pelo banqueiro de origem italiana. A. P. Giannini organizou uma sociedade gestora de participações sociais, a Transamerica Corporation, para evitar que o preço das ações fosse manipulado. As ações da nova empresa foram emitidas em troca de ações do Bank of Italy e da BancItaly Corporation. A nova sociedade dedicava-se a atividades bancárias e não bancárias para repartir os riscos. Com 1,1 mil milhões de dólares em ativos, a Transamerica foi uma força importante no setor bancário desde o dia em que iniciou a sua atividade. Em setembro de 1930, fundiu os seus bancos no Bank of America,
O regresso ao poder
Em 1930, nas audiências do Congresso, defendeu que “o pequeno cliente é o melhor que um banco pode ter, porque está sempre connosco. Começa connosco e fica connosco até ao fim. Ao passo que o grande está convosco desde que consiga tirar alguma coisa de nós; e quando não consegue, já não é para nós”. Pressentiu que era inevitável que os bancos passassem a operar de costa a costa, tal como faziam os grandes armazéns e as farmácias. Como disse ao Congresso em 1930, “está a chegar, senhores, e não há nada que possam fazer para o impedir”.
A.P. Giannini retirou-se do banco em 1930 e a liderança ficou com Elisha Wood e Jean Monnet. Nenhum dos dois, ao que parece, tinha a capacidade de levar o banco a bom porto durante a profunda depressão económica. À medida que as condições se agravavam, em 1930 e 1931, o crescimento do banco vacilou e os seus novos líderes decidiram abandonar a visão de Giannini de um sistema nacional de agências. Além disso, anunciaram planos para vender partes importantes do império bancário já estabelecido.
Furioso, A. P. Giannini anunciou a sua intenção de retomar o controlo do banco, o que conseguiu em fevereiro de 1932, e cumpriu a sua promessa de o revitalizar. Mas a sua visão de um banco com uma rede nacional foi mais difícil de recuperar.
O New Deal não pretendia fomentar impérios empresariais e, durante os finais da década de 1930 e os anos de guerra, o Bank of America travou uma batalha constante com o governo federal. A. P. Giannini nunca se quis perpetuar nos lugares porque dizia: “Deixo tudo para os jovens. É preciso dar autoridade e responsabilidade aos jovens se quisermos construir uma organização. Caso contrário, serás sempre o chefe e não deixarás nada para trás”. Em 14 de janeiro de 1936, cedeu a liderança ao filho Lawrence Mario Giannini (1894-1952), mas manteve-se na luta contra a Reserva Federal e a SEC (Securities and Exchange Commission), criada em 1934. No início da II Guerra Mundial, tinha 2,09 mil milhões de dólares de ativos.
A luta contra a riqueza
Em outubro de 1945, apenas quarenta e um anos após a abertura da primeira agência do Bank of Italy, o Bank of America ultrapassou o Chase Bank como o maior banco do mundo, com mais de 5 mil milhões de dólares em ativos. A. P. Giannini não queria construir uma grande fortuna pessoal, porque defendia que “demasiado dinheiro estraga as pessoas, sempre o fez e sempre o fará” distanciando-se dos “Robber Barons”, os grandes bilionários, J.P. Morgan, Vanderbilt ou Rockefeller. Muitas das suas citações têm a ver com dinheiro: “Nenhum homem é realmente dono de uma fortuna. Ela é que o possui”, “o meu trabalho mais difícil tem sido evitar ser milionário”, “a comichão do dinheiro é uma coisa má. Nunca tive esse problema.”
Quando morreu, o património líquido de A. P. Giannini não ultrapassava os 500 milhões de dólares, menos do que tinha quando fundou o Bank of America. “Nos termos do seu contrato com a empresa, ficava com 5% dos lucros anuais que era o suficiente para viver bem, viajar pela Europa, mas doava a maior parte do restante”, escreveu-se em “Wall Street People: True stories of the great barons of finance”, de Charles D. Ellis, James R. Vertin.
Durante a sua vida, criou duas fundações. Uma é a The Giannini Foundation of Agricultural Economics e foi fundada em 1930 a partir de uma doação feita pela Bancitaly Corporation de 1,5 milhões de dólares à Universidade da Califórnia em homenagem a Amadeo Peter Giannini. Já no seu 75º aniversário, a 6 de maio de 1945, criou e dotou a A.P. Giannini Foundation para apoiar a investigação inovadora nas ciências básicas e nos domínios aplicados.
Quando A.P. Giannini morreu, a 3 de junho de 1949, o Bank of America tinha 517 sucursais e mais de 6 mil milhões de dólares em ativos, quatro milhões de clientes individuais e detinha os depósitos de poupança de um em cada três californianos, ou seja, 40% do total de depósitos bancários do estado da California. Está enterrado no cemitério de Holy Cross, em Colma.
Como escreveu a 3 de junho de 1949 o jornal The Modesto Bee, “Amadeo Peter Giannini, rapaz vendedor ambulante de produtos que lutou para se tornar o maior banqueiro do mundo, morreu hoje de ataque cardíaco. Tinha 78 anos e estava constipado há um mês”. Nunca esqueceu as suas raízes e, após a Segunda Guerra Mundial, conseguiu empréstimos para ajudar a reconstruir as fábricas danificadas da Fiat em Itália. Atualmente, em Favale di Malvaro, na pequena aldeia de Acereto, a casa rural dos pais de Amadeo foi renovada pela cidade e transformada num museu que está aberto ao público desde 1983 em honra da família Giannini, que se denomina Museo dell’Emigrante “Casa Giannini”.
Na altura da sua morte, em 1949, a sua família dirigia um dos maiores impérios financeiros do mundo, pois o seu filho Mario era presidente da Transamerica, a empresa que detinha o Bank of America. Os vestígios desse império permanecem até hoje em quatro empresas: BankAmerica Corp, até 1980 a maior empresa bancária comercial do país; Transamerica Corporation, uma das maiores companhias de seguros do país, que em 1999 passou a fazer parte da Aegon; First Interstate Bancorporation, a maior holding bancária do país, que foi adquirida pelo Wells Fargo em 1996; e Citicorp, a maior holding bancária do país, da qual os Giannini foram em tempos os principais acionistas individuais.
A sombra de A. P. Giannini ainda pairou sobre o BankAmerica e, muitos anos depois da sua morte, os funcionários procuravam inspiração na coleção de 118 páginas de citações de A. P. Giannini, que circulava pelo banco, para resolver os problemas.