Quem quer um cão-robô? Quem financiou e andou a gastar dinheiro dos cofres nacionais e europeus nisto, em vez de atribuir os fundos a projetos científicos realmente necessários? Cães automatizados (e imagino que mais espécies virão... tomara que o lama não seja robotizado porque cospe demasiado) que visam auxiliar idosos e sobretudo pacientes com demência. Um auxílio que seria muito altruísta se o mundo tivesse perdido todos os cães e gatos.

É completamente indigno e contraditório ao progresso humano que haja cães-robô a substituir cães reais que necessitam de um lar e que podem ser um suporte facilitador na hora da doença e da tristeza. Assim como que cumprindo um dos votos de casamento. É que na verdade os cães ROBô só vêm ROubar dignidade aos animais de estimação existentes, assim como diminuir ainda mais a possibilidade e os comportamentos de adoção e resgate de animais que estão a agonizar em abrigos e canis insalubres.

Isto dos cães da robótica não é algo de agora. Como cientista que sou naturalmente já os tinha observado na investigação sobre interação humano-animal-robô, mas achei que nem deveria dar atenção ao disparate.  Um robô nunca vai reproduzir a empatia necessária, nem outras emoções e sentimentos que produzem a vinculação humano-animal. Há uma produção hormonal, sobretudo em cães, que determina o comportamento cuidador do cão de companhia. Sobretudo para os manter alerta e conectados aos seus donos. Agora os donos parecem querer um robô de estimação. Pior é ensinar isto às nossas crianças.

De repente, esta situação do cão automatizado fez-me lembrar de novo as festas da aldeia de onde venho, assim como de muitas outras, nas quais eu tentava perceber o interesse daqueles cães de plástico com um mecanismo robô singelo que os fazia mexer a cabeça e abanar a cauda. Eu com 6 anos já compreendia que aquilo era muito néscio. Mas agora tudo piorou face ao cão de plástico: evoluiu para um cão-robô cuidador (qualquer dia até doutoramento tem) de adultos e capaz de mandar embora o cão real que sempre esteve em casa. Sem sequer se pensar nas consequências para os cães abandonados nos canis de olhos famintos por uma família.

Numa altura em que seres humanos sofrem de falta de empatia após a pandemia, e em que os animais são cada vez mais abandonados, agora o cão de loiça virado cão-robô torna-se uma opção e publicitada ainda por cima? Refere-se o cão-robô como o ideal (e claro substituto do Bóbi) para os pacientes com doenças degenerativas por causa da sua inabilidade progressiva para poderem cuidar dos animais reais de companhia.

Mas este problema de saber cuidar dos animais não é algo relacionado sobretudo com os donos saudáveis que até expulsam os cães à sorte de uma alma viva que se compadeça com o bicho abandonado? A simplicidade de um animal de companhia está em saber ajudar, não pedir nada em troca e dar um assobio quando estiver a precisar do prato cheio. É aqui que entra a família, o vizinho e o amigo que pode ir ver a pessoa e o cão. Sem ser preciso despedir o cão companheiro, que afinal é como família.

A vantagem de um cão fiel (e gato) é estar preparado, pela sua filogenética, para ajudar sobretudo em casos de maior necessidade, e sobretudo aumentando os níveis de serotonina (a alegria que o cérebro espreme para o corpo) e diminuindo a solidão e a tendência para quadros depressivos. Isto já a ciência comprovou, portanto, cão-robô, desliga o teu botão.

 Professora universitária, investigadora científica e escritora