Já sabíamos que Pedro Nuno Santos é um homem moderno, pronto a governar pelas redes sociais e de dedo rápido no gatilho do telemóvel (lembram-se quando tivemos um novo aeroporto, que afinal eram três, o anúncio formal feito pelo então ministro das Infraestruturas e amplamente espalhado antes de o primeiro-ministro, António Costa, lhe despedaçar o sonho nem 24 horas depois, ao revogar o despacho mal pôs o pé em Portugal...?). Nem se percebe como os jovens, que vivem de olhos no ecrã e dedos colados ao teclado, não lhe caíram aos pés quando revelou todo o seu potencial ao aprovar uma indemnização de meio milhão de euros por whatsapp à administradora despedida da TAP, por ele nacionalizada, para ir integrar um regulador do setor e pouco depois entrar no governo de que ele fazia parte.
Porém, nem os mais preparados influencers imaginariam que o secretário-geral socialista, candidato a primeiro-ministro, fosse capaz de se revelar tão desejoso de agradar aos fãs como impulsivo na resposta aos que ameaçam cancelá-lo por irascibilidade e radicalismo. Mas Pedro Nuno provou que é capaz disso e de muito mais, se lhe derem a possibilidade. Preocupado, apesar de ter garantido entrevistas regulares nos canais de televisão, com o poder mediático que pode ter um comentário de Lili Caneças no Instagram — que o acusava de estar sempre a ralhar — e desejoso de mostrar como é "bem disposto, simpático e bom rapaz", tratou de responder à letra. "Lili, eu não dou ralhetes, mas quando os problemas são sérios não reajo com sorrisos."
Foi José Sócrates — que ao fim de mais de dez anos de truques, adiamentos e saltos mortais à retaguarda vai finalmente sentar-se no banco dos réus — quem inventou "a narrativa". E o jovem turco Pedro Nuno, que queria deixar os banqueiros alemães sem pagamento e de pernas bambas, aprendeu a lição do seu herói: uma mensagem repetida à exaustão acaba por passar como verdade. Pelo menos durante algum tempo.
Esta tem sido a narrativa socialista do momento: o governo de Montenegro, ele, o único culpado desta crise porque continuou a ganhar dinheiro com a empresa em nome da mulher e não tirou dúvidas aos jornalistas, ainda por cima foi incompetente e não resolveu os problemas dos portugueses. E o que parece bom foi o PS que fez, porque até há um ano era o PS quem governava o país.
No discurso, agora conduzido pelo mesmo Pedro Nuno Santos que comprou para a CP carruagens com amianto — o que "claro que sabia" e foi um "excelente negócio", sic— e que lançou três planos ferroviários e outros tantos programas para a habitação cujas consequências foram nulas ou poucochinhas, a contradição é tão óbvia que até chateia. Mas "a narrativa" tem conseguido convencer quem devia refletir e questionar. Surpreendentemente, porque, como dizia o outro, era só fazer as contas. Que imenso estrago podem ter feito 11 meses de uma AD boicotada pelas coligações negativas patrocinadas por PS+Chega (no IRS, nas portagens das SCUT...), quando comparados com nove anos de governação socialista, boa parte dos quais com o próprio Pedro Nuno dentro?
Foi, aliás, o próprio Pedro Nuno que conduziu a pasta da Habitação quando a crise se formou, engordou e se tornou insustentável, apesar das sucessivas promessas de casas que nunca saíram do papel. Foi o governo socialista que rebentou com o que funcionava na saúde, que empurrou as PPP para fora do barco, que apagou administrativamente listas de espera de doentes de cancro, que chamou piegas aos profissionais que caíam para o lado de cansaço em plena covid, que queria resolver a falta de médicos sem lhes mexer nos salários e acorrentando-os ao SNS. Foi o mesmo PS que repetidamente chumbou o tempo de recuperação de carreiras e quis resolver a falta de profissionais na educação pondo os lugares docentes à disposição de quem os apanhasse, fossem professores ou não.
Não, a AD não resolveu em 11 meses os problemas que se avolumaram durante quase uma década de governos socialistas, boa parte deles com Pedro Nuno Santos como primeiro imediato. Mas pacificou as crispadas relações nomeadamente com professores, polícias e boa parte dos profissionais de saúde e funcionários públicos garantindo-lhes o que era devido e fora prometido sem nunca antes ter sido cumprido. Decidiu e pôs a andar o novo aeroporto. Começou a pôr em ordem a imigração. Teve a originalidade absoluta de não subir impostos. E conseguiu negociar e fechar um importantíssimo investimento para o país: o primeiro Volkswagen totalmente elétrico e low cost, com que a marca alemã quer competir contra chineses e americanos, o ID. EVERY1, será produzido na Autoeuropa. Pedro Nuno pode espernear quanto quiser, mas este crédito é de Montenegro tanto quanto é de Costa o mérito do megacentro de dados de Sines.
Mas para já, para já, o líder socialista está preocupado é com a falta de esclarecimentos do PM aos jornalistas sobre a empresa que entregou aos filhos. O mesmo Pedro Nuno Santos que, só recordando alguns momentos mais próximos:
- em 2022 justificou o aeroporto que lhe foi revogado por Costa com um "erro de comunicação", sem direito a mais explicações aos jornalistas;
- em 2023, aos jornalistas, negou ter aprovado a indemnização a Alexandra Reis para depois assumir em CPI que se "esquecera" que tinha dado o OK por WhatsApp;
- em 2023 levantou mais dúvidas do que deu explicações quando questionado sobre como pagou a casa de 740 mil euros onde vive em Lisboa, dos quais a mulher (adjunta de Duarte Cordeiro primeiro na CML, depois no governo) pagou 290 mil a pronto e vindo o resto de um crédito bancário amortizado em poucos meses, dizendo primeiro à Sábado que fora o pai a ajudar mas depois, em Direito de Resposta, justificando a amortização com a venda da sua anterior casa.
Está preocupado com a falta de transparência o mesmo Pedro Nuno Santos que, como ministro, só falou sobre a sua participação na empresa da família, a Tecmacal, que recebeu mais de 1 milhão de euros em contratos com o Estado, quando o Parlamento o chamou pela quinta vez, após o governo socialista ter chumbado audições a oito ministros (incluindo Marta Temido e Manuel Pizarro sobre o encerramento de maternidades e urgências, a pedido do BE; Helena Carreiras, após terem sido postos à venda documentos classificados da NATO na darkWeb, a pedido de toda a direita; ou Elvira Fortunato, que o BE queria ouvir sobre a crise na habitação e a falta de apoios aos estudantes). Era também de Pedro Nuno o governo que consequentemente era acusado de "fugir a ser escrutinado".
É desse governo de António Costa que Pedro Nuno decalca as ideias que apresenta agora como suas, a começar pelas bandeiras da Habitação, Saúde e Economia mas sem esquecer a grande ideia do atual líder socialista (um clássico): pagar a alguém para estudar o que fazer com o país. "Um novo estudo Porter", arroga-se agora Pedro Nuno Santos, fazendo eco do que António Costa anunciava há cinco anos como o seu masterplan. E se no trabalho original, encomendado por Cavaco Silva (1994), os caminhos apontados e apenas em parte seguidos foram os têxteis, o calçado, o vinho, o turismo e a capacitação tecnológica, e Costa (2020) estava especialmente interessado nos "domínios e setores emergentes, como as baterias", o atual candidato socialista tem uma visão própria para a coisa: "analisar os setores e as áreas tecnológicas onde já temos competências instaladas e onde devemos apostar para transformar a economia, qualificar e pagar melhores salários". E disse!
Com ideias assim, teme-se que o debate pré-eleitoral não saia mesmo do quintal de Montenegro.