Cada vez mais mulheres ocupam um espaço que, durante séculos, foi predominantemente masculino. O número de cientistas mulheres tem vindo a crescer em praticamente todas as áreas, embora persistam disparidades significativas, especialmente em certas disciplinas e países. Enquanto as ciências da vida e da saúde apresentam uma distribuição de género mais equilibrada e, em alguns casos, até com maioria feminina, áreas como a engenharia e as ciências da computação continuam a ser dominadas por homens.

Contrariando a ideia estabelecida de que as mulheres publicam menos artigos científicos ao longo da carreira e que o seu trabalho recebe menos citações, um estudo baseado na análise de mais de 1,5 milhões de investigadores, revelou que homens e mulheres publicam em quantidades semelhantes e têm impacto equivalente, desde que tenham o mesmo tempo de carreira. O estudo, que reconstruiu o histórico de publicações de autores cuja carreira terminou entre 1955 e 2010, incluiu 83 países e 13 disciplinas, permitindo uma visão abrangente das diferenças de género no desempenho académico ao longo do tempo.

Os resultados sugerem que as diferenças observadas na produtividade e no impacto resultam de fatores como a duração da carreira académica e as taxas de abandono, que afetam de forma desproporcional as mulheres. As mulheres são mais propensas a fazer pausas na carreira ou a reduzir a carga horária de trabalho após a maternidade, a suportar uma divisão desigual do trabalho doméstico e do cuidado dos filhos, e a enfrentar vieses inconscientes, como a perceção de menor compromisso com a carreira ou menor disponibilidade. Estes vieses resultam no que Michelle Budig designou por "penalização da maternidade" (Motherhood Penalty), referindo-se às desvantagens que as mulheres enfrentam no mercado de trabalho depois de se tornarem mães. Em contraste, o "bónus da paternidade" (Fatherhood Bonus) descreve os benefícios profissionais conferidos aos homens quando se tornam pais, uma vez que a parentalidade tende a ser vista, no seu caso, como um sinal de estabilidade e compromisso.

Cada vez mais centros de investigação em Portugal, como o Egas Moniz Center for Interdisciplinary Research (CiiEM), valorizam a diversidade de género nos órgãos de liderança, reconhecendo a pluralidade de perspetivas e experiências como um fator essencial para alcançar ambientes de trabalho inclusivos e atrativos. Ao fazê-lo, contribuem para desconstruir estereótipos e proporcionar às novas gerações de investigadoras referências femininas, não como exceções, mas como protagonistas naturais de uma maior igualdade de género na ciência.

Esta diversidade de género nos órgãos de liderança contribui também para a sustentabilidade das carreiras científicas femininas. A minha experiência com a maternidade influenciou profundamente a perspetiva que tenho sobre a precariedade laboral em ciência e a necessidade de conciliação entre vida profissional e pessoal. Percebi, na prática, como o sistema vigente pode levar muitas mulheres a desistir de investigar. Uma liderança mais diversa permite trazer estas matérias para o centro do debate, transformando-o em ações concretas.

Um exemplo no CiiEM é a otimização do plano institucional de igualdade de género com a ferramenta GEAR (Gender Equality in Academia and Research), que reforça a monitorização de objetivos e a comunicação interna. Destaco também o progressivo alinhamento com o paradigma de avaliação impulsionado pela Coalition for Advancing Research Assessment. Este alinhamento privilegia a avaliação dos investigadores pela qualidade, mérito e relevância da investigação, em detrimento do uso isolado de métricas como o índice h. Este indicador foi proposto por Jorge Hirsch para avaliar a produtividade científica, com base nas publicações e citações; é-lhe apontado como tal um viés de género. A isto, somam-se medidas já adotadas, como a possibilidade de horários de trabalho flexíveis e de teletrabalho. Outras medidas a trazer para debate incluem o ajustamento dos períodos de avaliação dos investigadores à parentalidade.

Quando a ciência se torna mais feminina, passa a refletir melhor a diversidade da sociedade, com mais mulheres a investigar e representadas em posições de liderança. Ainda há barreiras a derrubar, mentalidades a transformar e oportunidades a democratizar, mas a ciência está a ganhar novas vozes, novas perspetivas e novas possibilidades. A ciência precisa de todas as vozes e chegou a hora de garantir que todas são ouvidas, passando da retórica à ação. Com mais mulheres na ciência, a investigar e a liderar, acredito que o futuro será mais transformador, mais inclusivo e mais humano.

Professora e investigadora na Egas Moniz School of Health & Science