Para o futuro, a União Europeia enquanto bloco estratégico e berço dos ideais democráticos necessita reposicionar-se a nível geográfico e diplomático com uma visão disruptiva para o continente africano. Em larga medida, a relação entre África e a Europa foi e ainda é marcada por um passado colonial complexo, mas esta aliança estratégica tem vindo a ser moldada por interesses em comum no posicionamento geopolítico global em rápida transformação, sendo relevante realçar o papel importante da diáspora portuguesa na realização do EurAfrican Fórum, realizado na NOVA SBE para fomentar diálogos bilaterais entre investimento e diplomacia.

Atualmente, a relação e colaboração estratégica entre estes dois continentes não foi limitada somente aos acordos comerciais, mas desenvolveu-se para uma articulação a médio-longo prazo em diversas áreas, como a sustentabilidade, digitalização e a própria reconfiguração das cadeias de valor globais.

Em contexto temporal e populacional é obrigatório observarmos a magnitude e a escala de crescimento de África. Segundo dados oficias do FMI (Fundo Monetário Internacional), em 2023 um artigo económico enquadrava o continente no ano 1900 com aproximadamente 140 milhões de habitantes (9% da população mundial); atualmente, os dados oficiais apontam uma população de 1,4 mil milhões de habitantes, devido a uma baixa taxa de mortalidade e uma das maiores taxas de natalidade do mundo, sendo que projeções da ONU para 2050 referem que o continente africano possa atingir os 2,5 mil milhões de habitantes, com 25% da população mundial a poder, em 26 anos, ser africana- E este crescimento é uma oportunidade única para a Europa, a nível diplomático e económico, face aos dois principais blocos: EUA/China.

A interdependência de África e União Europeia nunca foi tão evidente quanto neste período contemporâneo. Com 1,4 mil milhões de habitantes e recursos naturais abundantes em todo o seu espetro, este continente tem emergido como um dos principais focos de crescimento da economia global. E não podemos esquecer que atualmente a União Europeia é o maior parceiro comercial do continente africano, representando mais de 30% das transações comerciais (UE 2023), sendo a China a segunda maior força comercial. É necessário e crucial que África não seja vista somente como um fornecedor de recursos naturais e agrícolas, mas como um aliado estratégico a nível de inovação e desenvolvimento da economia verde.

Neste enquadramento estratégico também é crucial ter em mente as próprias ambições africanas. A Agenda 2063 da União Africana é um plano ambicioso que visa reposicionar o continente como uma das maiores potências mundiais e possibilitar a integração da totalidade do continente africano sem conflitos regionais e alicerçado pelos seus próprios cidadãos, criando uma força na arena mundial e “abanando” as esferas entre os atuais líderes económicos mundiais.

A ambição africana reflete-se, porventura, com o reposicionamento da União Europeia com o Pacto Ecológico Europeu, que visa a neutralidade climática até 2050. E porventura estes dois mindsets poderão criar um realinhamento de caminho iluminado para o futuro energético, dado o potencial enorme em energias renováveis de África. É óbvio, porém, que existem enormes desafios até do ponto de vista empresarial na exposição ao risco e na forma com os mecanismos financeiros podem alicerçar as expansões internacionais da empresas europeias em solo africano.

O caminho do novo Eldorado não é assim tão dourado, mas verde, em África, uma das áreas mais vanguardistas e que, num enquadramento de relações diplomáticas, deve ser realçado. É o posicionamento de transição energética global que coloca o continente africano no epicentro de toda uma revolução geopolítica e económica, tendo como base a capacidade de fornecimento de hidrogénio verde de países como a Namíbia, sendo que alguns países e empresas europeias já estão na pole position para reforçar relações e desenvolver economicamente as exportações de energia limpa, integrando desta forma os dois continentes. A IRENA (International Renewable Energy Agency) menciona que o continente africano poderá ter a capacidade de fornecer, até 2050, aproximadamente 25% da procura global por hidrogénio verde, e este enquadramento poderá criar, em África e na União Europeia, clusters tecnológicos energéticos e hubs de inovação sustentável, possibilitando À UE cumprir as suas metas “alucinantes” para a descarbonização, em linha com o Pacto Ecológico Europeu 2050.

Uma das colunas estruturais que possibilitam a África ter esta beleza e força é a sua capacidade regenerativa. E aqui é necessário demonstrar que a competitividade de um continente no atual período de transição digital/AI passa também pela vantagem estratégica de mais de 60% da população africana ter menos de 25 anos, segundo o CEEA 2024 - Centro de Estudos Estratégicos de África, aumentando exponencialmente a procura por inovação tecnológica, digitalização e conhecimento. Existem diversos mecanismos em ação, como o Digital for Development Hub e outros veículos de investimento europeu em startups africanas que visam o desenvolvimento agrotech e na dinamização da saúde digital. É verdade que o ecossistema ajuda imenso, mas observarmos cidade como Nairobi e Joanesburgo, a inovação é global, tendo um mercado em expansão, e este renascimento africano pode e deve redefinir o futuro destes dois continentes pela via das energias e da inovação, possibilitando a inclusão social e económica no povo africano.

Além de uma narrativa de oportunidades entre África e a União Europeia, existem ainda temas demasiados sensíveis entre estes dois continentes, como a mobilidade entre países africanos e a Europa. Apesar dos protocolos de conhecimento/mobilidade académica, é preciso seriamente maximizar este espetro e ter uma abordagem mais colaborativa. Outro grande desafio é ainda a desigualdade económica em África e a infraestrutura instalada, que continua a ser um obstáculo ao desenvolvimento significativo, assim como a fragmentação política de alguns países no continente africano.

Em suma, as oportunidades são enormes em África, nas próximas décadas, desde que exista cooperação entre os continentes e uma gestão diplomática adequada, contemporânea e inclusiva para enfrentar os novos desafios globais. Sendo o continente africano considerado o futuro motor económico do mundo, a Europa pode e deve ser o catalisador para maximizar este potencial. E neste âmbito, Portugal poderá ter uma palavra a dizer via PALOP, ajudando a redefinir África por via da inclusão face ao desenvolvimento social, económico e sustentável. Levará algum tempo, mas é preciso agir depressa neste atual enquadramento geopolítico.