O governo português planeia revisitar o Código dos Contratos Públicos ainda neste verão. O objetivo principal é claro: evitar os bloqueios frequentes aos concursos de obras públicas causados pelos concorrentes que não vencem os concursos. Esta iniciativa visa acelerar as obras públicas previstas no PRR, muitas delas orientadas para o setor da habitação, e também combater uma das grandes falhas do sistema judicial português: a lentidão dos processos pré-contratuais, muito potenciada pela litigância.

O sistema jurídico em Portugal tem sido apontado como um dos mais complexos da Europa, com uma moldura legal muito exigente no quadro europeu. Esta complexidade impulsiona a contestação por parte dos concorrentes que perdem concursos, resultando em atrasos significativos na execução de obras públicas. A revisão do Código de Contratação Pública é, assim, um avanço essencial para desburocratizar e agilizar estes processos, numa altura em que é crucial executar os fundos europeus com celeridade.

Entidades externas, como a OCDE, identificam a burocracia excessiva e a ineficiência judicial em Portugal como obstáculos críticos ao desenvolvimento económico do país. Considerando que 90% do investimento público nacional depende de verbas comunitárias, desperdiçar estas oportunidades devido a entraves administrativos e judiciais seria um grave erro e resultaria em prejuízos irrecuperáveis.

A intenção de revisão do Código de Contratação Pública é pragmática e até corajosa. É pragmática porque enfrenta diretamente um dos maiores desafios do nosso sistema: a morosidade judicial.  É corajosa, pois é anunciada num período em que é o intrincado ambiente judicial a ditar o ritmo a que o país progride.

Os partidos que apoiam o governo não têm maioria. Ver-se-á se os demais partidos compreendam a relevância decisiva que esta iniciativa tem para o país.

No sistema de Justiça português, é crucial que prevaleça o bom senso. A busca pela perfeição na legislação e nos processos judiciais pode conduzir a um atraso no desenvolvimento do país, com consequências negativas para a qualidade de vida dos portugueses.

A OCDE destaca que a resolução de um caso num tribunal administrativo em Portugal demora em média dois anos e quatro meses, um período significativamente mais longo que o de outros países europeus. Este atraso não só afeta a execução de projetos públicos como também desincentiva o investimento estrangeiro.

A litigância não pode ser um obstáculo ao progresso. O país não pode arriscar perder fundos europeus vitais devido à burocracia e à litigância pré-contratual. O combate à burocracia e a melhoria do sistema judicial são condições fundamentais para a atração de investimento estrangeiro e para o desenvolvimento sustentável de Portugal.

A revisão do Código dos Contratos Públicos é, portanto, uma medida necessária e sensata. Se implementada com rigor e pragmatismo, pode ser o início de uma reforma mais ampla do sistema de Justiça em Portugal. Portugal está, assim, num momento crucial de decisão.

Nesta fase, “bom senso” é a expressão-chave para o país. Será que o bom senso prevalecerá, permitindo a Portugal aproveitar ao máximo as oportunidades de desenvolvimento que tem à disposição? Ou serão os exageros que resultam da ausência de bom senso a ditar a hipoteca da qualidade de vida futura dos portugueses?

Economista e professor universitário