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Parabéns, Algarve!

A região prova que é possível ser-se uma potência turística sem depender de uma mega infraestrutura aeroportuária nem de uma companhia aérea nacional.
Parabéns, Algarve!

O Turismo do Algarve celebrou esta semana 55 anos de existência e marcou a data com um ciclo de palestras e mesas redondas sobre a indústria. Esta história de “sucesso” teve um ponto de partida fundamental: a construção do Aeroporto de Faro, inaugurado há 60 anos. Antes disso, a única forma de chegar à região era aterrar em Lisboa, seguindo depois viagem por via terrestre, o que limitava severamente o potencial turístico do Algarve. Esta dificuldade de um acesso direto fazia com que muitos turistas optassem pelas costas espanholas que, à época, já beneficiavam de voos sem escalas para os seus aeroportos e, consequentemente, de uma melhor conectividade com os principais mercados emissores.

Com a inauguração do Aeroporto de Faro em 1965, abriu-se, de facto, uma nova porta de entrada em Portugal e, em particular, para desenvolver o turismo, muito incipiente na região. A TAP iniciou operações com apenas três voos semanais para Lisboa e foi a transportadora da maior parte dos 59 mil passageiros que utilizaram o aeroporto de Faro no seu primeiro ano. Hoje, 60 anos depois, a TAP voa apenas três vezes por dia para Faro e Lisboa continua a ser a única rota servida pela companhia de bandeira estatal. Em 2024, quase 10 milhões de passageiros passaram por Faro, mas apenas 3% viajaram com a TAP. Ao longo destas cinco décadas, o mercado aéreo passou das mãos das chamadas companhias charter, que transportavam apenas turistas estrangeiros com pacotes pré-comprados nos seus países e que não podiam vender voos com ponto de partida no Algarve, para as companhias de baixo custo, que democratizaram o acesso ao transporte aéreo para todos e multiplicaram os destinos servidos. Agora sim, os algarvios também podem usufruir das ligações aéreas para os mais de 75 destinos, em vez de observarem os aviões a aterrar na região sem os poderem utilizar.

Apesar de ser o líder do turismo internacional em Portugal em vários parâmetros, o Algarve tem um aeroporto que ocupa apenas a terceira posição em volume de passageiros. A TAP tem uma presença irrelevante nesta infraestrutura com menos de 3% do mercado e uma única rota, enquanto a Ryanair domina com 36%, seguida da easyJet (19%), Jet2 (10%), Transavia (6%) e Aer Lingus (3%). Estes factos provam que é possível ser-se uma potência turística sem depender de uma mega infraestrutura aeroportuária nem de uma companhia aérea nacional e ainda menos sem depender de uma missão de hub.

Com a ascensão galopante e desequilibrada do turismo no Algarve nestes 55 anos, a economia algarvia transformou-se. A pesca e a agricultura perderam espaço, enquanto a paisagem foi drasticamente alterada. Muitas zonas protegidas ou aldeias típicas foram convertidas em urbanizações sem alma, alojamentos turísticos descaracterizados e infraestruturas pensadas para um turismo sazonal massificado. O Algarve tornou-se um destino de verão, com noites quentes animadas e dias de praia ensolarados, mas com um forte desequilíbrio sazonal nos fluxos turísticos, convertendo-se num destino vazio e abandonado durante metade do ano.

Socialmente, os algarvios habituaram-se a ciclos temporários e estivais de emprego. A corrida aos recursos, como água, terrenos e infraestrutura, foi ganha pelo turismo, deixando poucas opções de trabalho além deste setor, tornando escassa a habitação principal acessível e próxima dos locais de trabalho, enquanto o transporte público é altamente deficitário devido à falta de investimento. A emigração dos algarvios que pretendem outra vida tem sido substituída pela imigração para cobrir as enormes necessidades sazonais de mão-de-obra no turismo.

Nas últimas eleições legislativas, os eleitores do Algarve expressaram claramente a sua insatisfação com todo este cenário socioeconómico e a subalternização que o poder central demonstra pela região, fazendo desta a única região do país onde o partido Chega venceu. Os algarvios estão fartos de serem só a praia mais estrangeira do país! Parabéns ou paramaus: no próximo dia 18 de maio, não se surpreendam com os resultados que virão das urnas "de Portugal e dos Algarves".

Docente em Sistemas de Transporte e consultor em aviação, aeroportos e turismo

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