O país, conhecido pela sua democracia direta e pelos seus cenários naturais idílicos, como os picos alpinos ou os lagos cristalinos, enfrentou um ano repleto de diversas calamidades climáticas com impactos económicos, geográficos e humanos: desde o recuo mais acelerado dos glaciares que leva à necessidade de redesenhar as fronteiras com a Itália aos vários deslizamentos de terras, passando por violentas e mortais inundações.

Ainda assim, apesar da gravidade da situação local e global, mais de 60% dos suíços rejeitaram a iniciativa de preservação da biodiversidade que lhes foi proposta.

No referendo em causa, procurava-se aprovar um novo pacote legislativo que garantisse uma maior proteção ambiental, incluindo um fundo de 400 milhões de francos suíços (aproximadamente 421 milhões de euros) para os agricultores preservarem melhor a biodiversidade nas suas terras e rios numa tentativa de conciliar a atividade humana com as preocupações ecologistas. Entre as várias medidas propostas encontrava-se também a proibição de novas construções em áreas protegidas, visando permitir que a flora e a fauna locais pudessem desenvolver-se com menor interferência humana e contrariar a tendência de extinção de espécies – uma das mais severas entre os países da OCDE – que se verifica no país alpino.

Politicamente, este referendo opôs esquerda, verdes e liberais-ecologistas aos partidos de direita – líderes no parlamento e no executivo – que fundamentaram a sua posição no facto de já serem gastos cerca de 600 milhões de francos suíços (631 milhões de euros) por ano na proteção da biodiversidade. A campanha contra a proposta resumiu-se numa frase simples: “Sim à biodiversidade, mas não a esta iniciativa onerosa e extremada da biodiversidade”; que, no seu entender, iria limitar severamente a produção de energia e alimentos sustentáveis, prejudicaria o turismo e encareceria a construção civil.

Os pequenos cantões urbanos de Basileia (cidade) e Genebra foram os únicos a votar a favor das medidas, evidenciando uma clara divisão entre cantões puramente urbanos e todos os 24 restantes (rurais ou mistos). Nas zonas tradicionalmente agrícolas e mistas, a proposta foi vista como uma ameaça às atividades económicas e à liberdade de gestão territorial. Dois dias depois deste referendo foi a vez de a IATA, a Associação Internacional do Transporte Aéreo, com sede em Genebra, divulgar as “suas” contas e informar que, para “zerar” as emissões de carbono na aviação até 2050, o setor precisará de investimentos anuais de 128 mil milhões de dólares. E com isso deixou no ar a pergunta: "Quem vai pagar esta conta?"

Obviamente que esta questão apenas faz sentido porque o ponto de partida atual da aviação é o de que poluir é… grátis.

A verdadeira questão de fundo que este referendo levanta é, no entanto, bem maior do que a pequena Suíça. Se um dos países mais ricos do mundo e com melhor distribuição dessa riqueza, se um dos países mais conhecidos pela sua beleza natural e com uma população bem informada, se um país com estas características não está disposto a investir um pouco mais na preservação do ambiente, que esperança nos resta para que outros países com menos recursos e maiores desafios façam alguma coisa? Se um país como a Suíça rejeita esta iniciativa, o que podemos realisticamente esperar do resto do mundo? Até que ponto é que as populações estão dispostas a abdicar de benefícios imediatos em nome da preservação do planeta e como é que podemos exigir mais dos políticos se, no final, o argumento económico prevalece entre os eleitores?

Obviamente, de nada serve que o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, em abril deste ano, tenha deliberado, numa condenação histórica promovida pela Associação Avós pelo Clima, que a Suíça não faz o suficiente para combater as alterações climáticas e que as suas políticas internas são insuficientes para alcançar a neutralidade carbónica até 2050.

Resta-nos, por isso, apenas refletir no outro lado desta equação: quanto nos custará não salvar o planeta?

Docente em Sistemas de Transporte e consultor em aviação, aeroportos e turismo